Jornal da Cidade

“Corri 15 anos descalça”: a história da cortadora de canaque virou referência no esporte

Maria Zeferina Baldaia, campeã da São Silvestre em 2001, superou a pobreza e o preconceito para fazer história nas corridas de rua. A história de Maria Zeferina Baldaia é daquelas que transcendem o esporte e se confundem com a própria vida do povo brasileiro. Mineira de Nova Módica, ela cresceu em Sertãozinho, no interior de São Paulo, onde os pais foram trabalhar no corte de cana. Desde muito cedo, ajudava no sustento da família: aos cinco anos já chacoalhava amendoim e apanhava algodão. Pouco depois, capinava e cortava cana. O suor e a dureza do campo moldaram sua resistência, mas também despertaram o sonho que a levaria a conquistar algumas das maiores corridas do país, como mostra o 10º e último episódio da série “Uma Corrida pela História”, com dez reportagens no EPTV1 — uma por semana, sobre as 40 edições da Corrida Integração, uma das provas mais tradicionais do Brasil. Em 2001, Maria Zeferina surpreendeu o Brasil ao vencer a Corrida Integração, em Campinas. No mesmo ano, cravou seu nome na São Silvestre, a mais tradicional prova de rua do país. Foram conquistas que coroaram anos de esforço, mas que têm raízes bem mais simples: sua primeira corrida aconteceu ainda na infância, em uma gincana da igreja, quando ela tinha apenas 12 anos. — Participei descalça, calça jeans e blusinha de manga, bem simples. Nessa corrida tinha um moço que correu descalço e ganhou. Ele me viu correr e disse que eu levava jeito. Conversou com minha mãe, e ela disse: ‘ela (Zeferina) não pode porque trabalha — relembra. O incentivo do corredor foi determinante para ela continuar. Ele se dispôs a buscá-la com a perua da equipe aos domingos, para que pudesse participar das provas sem atrapalhar o trabalho. A partir dali, Zeferina começou a competir na região, mas precisou enfrentar preconceitos e barreiras sociais. — Pessoal falava que aquilo não era esporte para menina, que lugar de mulher era em casa, no fogão, no tanque, cuidando dos filhos. E aí, eu assistindo à São Silvestre, na casa da vizinha, vi a Rosa Mota ganhar, portuguesa que ganhou a São Silvestre seis vezes — conta. Aquela cena foi um divisor de águas. — Corri para a casa e disse: ‘Mãe, uma mulher pequenininha ganhou a corrida de São Paulo. Será que um dia também posso ir lá nessa corrida e, quem sabe, ganhar e ajudar nossa família? O caminho, porém, não foi fácil. Foram 15 anos correndo descalça porque não tinha condições de comprar tênis. Pedia patrocínio, mas as portas se fechavam. Ainda assim, ela não desistiu, acreditando que algum dia alguém apostaria em seu talento. Durante o trabalho na lavoura, sonhava com horizontes mais distantes. — Quando cortava cana, eu via os aviões passando e eu parava segurando a enxada e falava ‘me leva, avião’ — recorda. Hoje, graças ao esporte, Maria Zeferina já conheceu mais de dez países. As vitórias a levaram do chão batido das plantações para o asfalto das maiores corridas do mundo. O reconhecimento também veio em sua cidade. Sertãozinho batizou o Centro Olímpico com o nome de Maria Zeferina Baldaia, um espaço que eterniza sua trajetória e inspira novas gerações. — Eu passo ali em frente, paro, começo a olhar, parece que estou sonhando. Fico feliz de saber que consegui proporcionar algo bom para o meu povo, para a minha população — diz, emocionada. Corrida Integração A 40ª edição da Corrida Integração de Campinas entrou para a história antes mesmo das provas – marcadas para 27 e 28 de setembro. Com o recorde de 15 mil inscritos (quase o dobro dos 8,5 mil de 2024), as vagas foram esgotadas com antecedência pela primeira vez. A edição conta com novidades para o participante, como a inclusão da inédita meia-maratona (21km), a corrida Kids, uma EXPO interativa e também os desafios “Andorinhas” Voo Curto (5km no sábado e 10km no domingo) e Voo Longo (5km no sábado e 21km no domingo).

Com o novo formato, o sábado (27) será reservado para caminhada, corrida Kids e percurso de 5 km; no domingo, será a vez dos percursos de 10 km e 21 km (meia-maratona). Todas as modalidades têm a Praça Arautos da Paz, na Lagoa do Taquaral, como ponto de partida e também de chegada.
Criada em 1984, a Corrida Integração reúne, desde então, atletas de elite e corredores amadores, consolidando-se como uma das corridas de rua mais importantes do Brasil. Na última edição, os vencedores foram o brasileiro Walace Evangelista Caldas e a angolana Felismina da Silva.
A lista dos maiores vencedores no masculino é liderada por Altobeli Santos Silva (2022, 2018 e 2017), Diamantino Silveira Santos (1986-87-88), Vanderlei Cordeiro de Lima (1995-97-99), Valdenor Pereira dos Santos (1996-98-2001) e Giovani dos Santos (2013-15-16).
Entre as mulheres, a relação é dominada por Joana DArc Jeremias (1985-86-88), Viviany Anderson (1993-94-96) e as quenianas Eunice Jepkirui Kirwa (2009-10-11) e Nancy Jepkosgei Kipron (2008-13-14).